sábado, 22 de dezembro de 2018

OBEDIÊNCIA VERSUS DESOBEDIÊNCIA CIVIL

Prometi-me não tecer comentários políticos neste blog. Não sei até que ponto possa cumprir essa promessa, se bem que o tente, pois se censuro uma situação de poder, critico o partido que exerce o poder, e se critico a forma do exercício da oposição, censuro a oposição. Estou equidistante de todas essas forças, pretensamente cada vez mais distante.
Vem isto a propósito do arremedo dos coletes amarelos portugueses, numa imitação menos conflituosa e numerosa relativamente à mesma cor dos coletes franceses.
Só me pronuncio sobre a lusa gente contestatária, para dizer simplesmente que posso não concordar com a forma, mas certamente concordo com o conteúdo. Um povo, seja ele qual for, tem o direito de se manifestar ou, como os políticos apreciam dizer, de passarem à desobediência civil.
A obediência é sinal de estatuto democrático; o estatuto da desobediência é sinal de democracia. Não é a génese da própria a  palavra “poder do povo”? Ou o poder exercido pelo povo nas eleições significa entrega total a todos os disparates dos eleitos? No Preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, não se exige, como direito, na suma concretização dos seus 30 artigos, “para que o homem não seja compelido, em supremo recurso (eu acrescentaria legítimo recurso), à revolta contra a tirania e a opressão”?
Não aprecio povos anestesiados ou arregimentados a ideologias cegas; nem me agrada de todo confiná-los a quatro paredes vãs de oratória ou a tentativas da morte da democracia, que é o seu sangue, como pretender roubar-lhe a vida nos extremismos da política, por alma de quem nem se permita rezar uma oração.
Beel-Zebud, que parece ter sido um deus filisteu (de que proveio o apelido Belzebu), teria o condão de afastar as moscas dos seus templos. Daí ser conhecido como o deus das moscas. Não me parece que se possa permitir a encarnação política de Beel-Zebud nos tempos que correm, nem o povo deve ser confundido com as moscas que atormentam o seu templo de poder.
Embora em Portugal, pelos tempos que correm, felizmente ainda não se chegasse a tanto, tenho para mim que a obediência civil não pode conduzir a subserviência civil, nem os poderes são eternos.

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