sábado, 28 de dezembro de 2019

PARA PIOR, JÁ BASTA ASSIM


O ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, sugeriu qualquer coisa como isto: as aldeias ribeirinhas do Baixo Mondego vão acabar por ter de mudar de sítio, para sair das zonas de risco. E acrescentou, como aviso: “paulatinamente, as aldeias vão ter que ir pensando em mudar de sítio porque não esperemos que esta capacidade que temos possa vir a crescer. Isso é o contrário da adaptação". Ou seja, tal como nas lendas, em que as formigas obrigaram as aldeias a afastarem-se dos leitos de água, a deslocação das aldeias do Mondego não pode ser tabu, embora não tenha um plano A, B ou C.
A solução - nem sei se acredite nisto - pode passar por rebocar as casas para uns metros mais longe das margens, tantos os que os cálculos do ministro determinem.
Tudo isto, como é evidente, devido à culpa das alterações climáticas e do degelo, que afectarão principalmente o rio Mondego, o que não acontecerá na costa portuguesa e muito menos onde teimam em instalar o aeroporto do Montijo, onde já há plano para subir a cota em 5 metros, à cautela, sem necessidade de deslocalização. Suponho até que esse plano preveja a construção do aeroporto sobre estacas, tipo aldeia palustre asiática.
Este aviso servirá para as cidades à beira-mar, se os santos da costa não as protegerem como protegem o ministro. Subindo o nível do mar, como prevêem os cientistas sibilinos - já terá o Mondego a designação de maior rio da Europa - deslocam-se as cidades para sítios onde os habitantes possam andar nas ruas sem molharem os pés.
Se alguém tem pachorra para aturar isto, continue, pois a mim, que me canso de ouvir tanto disparate, já me falta…

Falta-me avisar – pois também tenho direito a publicar avisos – que a montagem feita na imagem é pura coincidência futura com uma pessoa que me parece real numa revista irreal, bem como os “santos da costa” coincidirem, na designação, com os apelidos do primeiro-ministro. Já cheguei à conclusão que, tal como estamos, será melhor sorrirmos para não chorarmos, embora o povo tenha outro rifão, que diz “para pior, já basta assim”.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

O LAMBE-BOTISMO, ACTIVIDADE COM FINS LUCRATIVOS



Nem sei se alguém, algum dia, pensou em tributar esta actividade, que ora nem sequer consta do CAE – acrónimo de Código das Actividades Económicas – a qual, pelo que me parece, é deveras lucrativa, recebendo em dividendos e outras pagas. Seria então difícil o cálculo da tributação, porque de grande dificuldade no apuramento dos grandes resultados lucrativos, designadamente por quase ausência de custos, a não ser a “saliva” da lambidela de botas.
O lambe-botista almeja sempre mais em benefício próprio, quase sempre à custa do prejuízo de terceiros. A gama ou espectro da actividade é vastíssimo, exercendo-se em linha ascendente, por vezes com descaro e malvadez, se bem que dissimulado como convém ao lambe-botas. É exercido no âmago da situação do dito, de preferência com o fito de alcançar serviço nas “gáspeas” metafóricas do superior hierárquico – chefe, director, patrão, professor, empregador, oficial, autarca, político, enfim, uma colossal gama de patamares do calçado onde a língua pode prestar a si própria relevante serviço.
Devia ser, repito, uma actividade registada, com o devido enquadramento fiscal, mesmo que exercida em acto isolado ou em regime de actividade ilegal. Também poderá ter enquadramento fiscal, se bem que ninguém se proponha colectar como “outros prestadores de serviços”.
A actividade está reconhecida e nem sempre passa despercebida no meio onde se exerce. Também já tem iconografia, como o quadro que abre este arrazoado - “No país dos lambe-botas” – um óleo s/ tela, de 70x80, de Luiz Morgadinho.
Nunca me vi nessa actividade, talvez porque nem jeito nem feitio me predispõe para ela; pelo contrário, em vez de lamber as botas, presumo até que manchei algumas, mormente quando enfrentei, verbalmente e por escrito, superiores hierárquicos e outros santos em vários altares. Também não posso dizer que permiti o benefício de terceiros quando hierarquicamente estive em chefia e administração, embora tivesse alguns “profissionais” para fazer o serviço nas minhas “botas”, porque para mim o valor de cada um é o princípio da minha apreciação, e nada mais.
O lambe-botismo é, tal como a prostituição, tão antigo como o mundo. Pelo menos tão antigo quanto o é o reino dos símios, sendo que neste é princípio estabelecido. É, pois, uma ilicitude tolerada. A este exercício, que eu designo por lambe-botismo, o Miguel Esteves Cardoso chama engraxanço e culambismo, tendo os mesmos princípios e sobre a mesma actividade. E o Miguel vai mais longe, afirmando que a actividade evoluiu com os tempos e que se foi “subindo na escala de subserviência, dos sapatos até ao cu”. E assegura o Miguel: “O pior é que a nossa sociedade não só aceita o culambismo como forma prática de subir na vida, como começa a exigi-lo como habilitação profissional. O culambismo compensa”.
Logo, entre a minha designação e a do Miguel, só há a diferença semântica. A actividade está aí para durar, evoluir na forma, progredir e tentar passar despercebida na sociedade, bastando ser percebida – e bem entendida, para recepção das graças – pelo dono das botas.

terça-feira, 10 de dezembro de 2019

GUARDADO ESTÁ O IVA...



O chico-espertismo da dupla Costa e Centeno, mais da calculadora que ambos não deixam em descanso, levou-os a uma ideia luminosa, daquelas que aparecem como uma lâmpada sobre a carola, tal como o Professor Pardal, da Disney. Para minorar a diminuição do caudal de entrada do IVA calculado sobre o consumo de electricidade, que a Oposição os força a aplicar como condição “sine qua non” sobre o Orçamento de Estado, vá de quererem uma taxa progressiva ou degressiva (o que vai dar ao mesmo) sobre os consumos: quem consome mais tem uma taxa superior a quem consome menos. Isto até parece uma medida justa, uma prenda no sapatinho, mas tem o seu quê de esperteza saloia. Como quem consome menos terá uma taxa reduzida, a cobrança “a sério” é para as taxas a quem consome mais, ou seja, o IVA engrossa sem grande mossa. Para além disso, os partidos mais à Esquerda, estarão a esfregar as mãos, visto terem concretizado o objectivo propagado e nivelar por baixo os que poupam mais energia; e os mais à Direita, para ficarem bem na fotografia, ajeitam a gravata e concordam.
Todos se agarrarão à ideia como hera a um tronco. E lá se vai a temida coligação negativa no Parlamento! É de mestres!...
Há uma questão que eles certamente colocaram aos ouvidos um do outro, a estremecerem de patéticos: quem agora consome menos, graças à benesse, poderá passar a gastar mais e aquilo é como o quartel-general em Abrantes, tudo como dantes…
Só gostaria de saber se aquelas duas inteligências se lembram que os habitantes dos climas mais frios, como o interior Norte e Centro do País, têm de forçosamente consumir mais energia eléctrica, seja qual for a fonte de calor recorrido! Ou pensam também solicitar que sejam alterados os critérios sobre o princípio da estabilidade do IVA para esses casos?
Há um obstáculo: o IVA não admite taxas variáveis, nem será suposto que se autorizem taxas variáveis (ou aquilo não é elástico, como consta da Directiva Comunitária, ou a Comissão Europeia se curva às jogadas do Ronaldo das Finanças), ainda com a perspectiva da inconstitucionalidade da medida. Vá então de pedirem à Europa que abram esse precedente, o qual poderá abrir outros precedentes e vogar no abstracto pelo consumo mais e menos como, por exemplo, quem consumir mais gasolina, pagará mais imposto, e quem andar só aos fins-de-semana, pagará menos.
Será que não se pode considerar um Prémio Nobel para as cabecinhas mais pensadoras? Certamente que não ficará o Saramago como, até agora, o único galardoado luso!
No jogo de números na “playstation” orçamental, o zero é a tecla mais batida – é como se se tratasse de um aparelho Morse, tec,tec,tec. Guardado está o IVA para quem o há-de comer. A ver vamos…