Nem sei se alguém, algum dia, pensou em tributar
esta actividade, que ora nem sequer consta do CAE – acrónimo de Código das
Actividades Económicas – a qual, pelo que me parece, é deveras lucrativa,
recebendo em dividendos e outras pagas. Seria então difícil o cálculo da
tributação, porque de grande dificuldade no apuramento dos grandes resultados
lucrativos, designadamente por quase ausência de custos, a não ser a “saliva”
da lambidela de botas.
O lambe-botista almeja sempre mais em benefício
próprio, quase sempre à custa do prejuízo de terceiros. A gama ou espectro da
actividade é vastíssimo, exercendo-se em linha ascendente, por vezes com
descaro e malvadez, se bem que dissimulado como convém ao lambe-botas. É
exercido no âmago da situação do dito, de preferência com o fito de alcançar
serviço nas “gáspeas” metafóricas do superior hierárquico – chefe, director,
patrão, professor, empregador, oficial, autarca, político, enfim, uma colossal
gama de patamares do calçado onde a língua pode prestar a si própria relevante
serviço.
Devia ser, repito, uma actividade registada, com o
devido enquadramento fiscal, mesmo que exercida em acto isolado ou em regime de
actividade ilegal. Também poderá ter enquadramento fiscal, se bem que ninguém
se proponha colectar como “outros prestadores de serviços”.
A actividade está reconhecida e nem sempre passa
despercebida no meio onde se exerce. Também já tem iconografia, como o quadro
que abre este arrazoado - “No país dos lambe-botas” – um óleo s/ tela, de
70x80, de Luiz Morgadinho.
Nunca me vi nessa actividade, talvez porque nem
jeito nem feitio me predispõe para ela; pelo contrário, em vez de lamber as
botas, presumo até que manchei algumas, mormente quando enfrentei, verbalmente
e por escrito, superiores hierárquicos e outros santos em vários altares.
Também não posso dizer que permiti o benefício de terceiros quando
hierarquicamente estive em chefia e administração, embora tivesse alguns
“profissionais” para fazer o serviço nas minhas “botas”, porque para mim o
valor de cada um é o princípio da minha apreciação, e nada mais.
O lambe-botismo é, tal como a prostituição, tão
antigo como o mundo. Pelo menos tão antigo quanto o é o reino dos símios, sendo
que neste é princípio estabelecido. É, pois, uma ilicitude tolerada. A este
exercício, que eu designo por lambe-botismo, o Miguel Esteves Cardoso chama
engraxanço e culambismo, tendo os mesmos princípios e sobre a mesma actividade.
E o Miguel vai mais longe, afirmando que a actividade evoluiu com os tempos e
que se foi “subindo na escala de subserviência, dos sapatos até ao cu”. E assegura
o Miguel: “O pior é que a nossa sociedade não só aceita o culambismo como forma
prática de subir na vida, como começa a exigi-lo como habilitação profissional.
O culambismo compensa”.
Logo, entre a minha designação e a do Miguel, só há
a diferença semântica. A actividade está aí para durar, evoluir na forma,
progredir e tentar passar despercebida na sociedade, bastando ser percebida – e
bem entendida, para recepção das graças – pelo dono das botas.
Diz-se por aí que "não há personalidades incorruptíveis -há é bons e maus corruptores".Por analogia diria que não há personalidades incólumes- há é bons e maus culambistas ou lambe-botistas. Diria ainda: quem não gosta de umas cócegazinhas no ego?
ResponderEliminarCaro amigo Luís
ResponderEliminarA questão não está nas botas ou no dono das ditas, mas na língua de quem lambe. Não sendo prejudicial para terceiros, até faz bem ao ego de quem calça e progresso a quem lustra.
Eu também a favor de criação de um CAE próprio para o lambe-botismo, o engraxanço e culambismo pois sempre pagariam de alguma forma o que advêm dos seus actos. E porque não também serem portadores de uma etiqueta na lapela para os demais pares assim ficarem a saber.
ResponderEliminarBoas Festa caro amigo.
Caro Amigo João
EliminarCertamente alguns nem precisam de distintivo na lapela, pois manifestam-se sem se manifestarem. Há-os em todos os lugares e em todos os níveis, nem sempre sob o lema da inocência, principalmente porque beneficiam da lambidela, ao passo que aqueles que não esfregam a língua até são prejudicados.
Boa Festas
Quando o lambe-botismo se institucionaliza como desculpa para a incompetência está o caldo entornado... passamos todos a remediar em vez de prevenir! Mas eu assino Abaixo o lambe botismo. Boas festas caro amigo. Abraço caloroso.
ResponderEliminarCaríssimo Carlos
EliminarPor vezes, o lambe-botismo nem chega a ser apenas uma forma de sobrevivência, segura-se como forma de subserviência. Devidamente controlado, tolera-se. O problema é quando a lambidela conspurca a situação de quem se nega a lamber.
Um grande abraço