quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

A HISTÓRIA DA "TESOURARIA" DA BOSSA DO DROMEDÁRIO



Como tinha prometido no post anterior, dado tratar-se da Curva da Bossa do Camelo, resta saber a história do bicho desde o seu nascimento.
Esta curva foi, desde o seu início, objecto de todas as críticas e de nenhum aplauso, à excepção dos donos da vinha que obrigaram a um arco dos mais acentuados da Europa e a fazer inveja às curvas da pista de Indianápolis.
Em 2002, com as obras em decurso no local, aquilo parecia uma barafunda. Não andavam nem deixavam andar. Tanto assim durou o impasse, que em 26 de Fevereiro de 2006, o jornal Correio da Manhã apontava o entrave à régua, esquadro e transferidor: uma vinha.
https://www.cmjornal.pt/exclusivos/detalhe/quinta-de-carrilho-salva
A razão desse imobilismo apareceu quando  a solução inicialmente defendida por Fernando Ruas, presidente da Câmara de Viseu, mereceu fortes críticas de proprietários de vinhas que iriam ser destruídas. Entre estes proprietários está a família de Manuel Maria Carrilho, ex-ministro e candidato socialista à Câmara de Lisboa nas últimas Autárquicas”.
Ainda segundo o mesmo diário “principalmente no Verão, o casal Manuel Maria Carrilho e Bárbara Guimarães, mais o filho, “passam algum tempo” na quinta, “porque tem muita sombra e é sossegada”.
Para que o casal não fosse “desassossegado” por esse traçado e as uvas continuassem a fazer vinho do Dão na Quinta de São Domingos - nem que seja para embriagar condutores para serem apanhados pelo “balão” - a coisa levou aquela volta, muito diferente daquela que seria se fosse eu o dono das vinhas de casta toriga e roriz.
O jornal, em artigo pertinente – lembro, escrito em 2006 – continua o historial, dizendo que “avançou um traçado provisório que é marcado por uma curva perigosa, em forma de cotovelo. Se o projecto inicialmente previsto fosse avante, Manuel Maria Carrilho e os seus irmãos, herdeiros do antigo presidente da Câmara de Viseu, Manuel Engrácia Carrilho, veriam a quinta dividida pela auto-estrada”.
Havia outras alternativas que evitassem o estabelecimento no local da actual tesouraria? Havia, sim senhores. No início apresentaram-se duas hipóteses: a passagem da A25 a norte de Viseu, aproveitando o traçado tipo “carreiro de cabras” do IP5, ou a sul, que arrasaria muitas vinhas, que já não eram da dita família, e obrigaria ao derrube de habitações. Como estas duas alternativas não foram aceites, designadamente a do traçado do IP5, recusada pelo autarca de Viseu, Fernando Ruas (jamais, “jamé”), ficava aquela em arco pronunciado, logo prometida como “provisória” pelo ministro das Obras Públicas, Carmona Rodrigues: curva em cotovelo, com tesouraria e “sniper”, ligando a A25 ao actual troço que liga IP3/IP5. O ministro das Obras Públicas, Mário Lino, em Novembro de 2007 reconheceu que a curva "Bossa do Camelo", em Viseu, é "um estrangulamento" mas admitiu que “alterar a curva custa muito dinheiro", para concluir que outras obras eram consideradas prioritárias à sua correcção, tal como o “jamé, jamé” do aeroporto na margem sul do Tejo. Ora, pois, enquanto aquela curva rendesse o que rendia, com ar de desenfado, deixá-la estar!
Tudo seria a contento de todos, menos da tesouraria, não fosse neste país o significado de provisório e irrevogável serem, para a política alternante, diferente daqueles que estão no dicionário. A “ferradura” tipo autódromo ali ficou, concluída “provisoriamente” até que a construção do troço a sul estivesse concluída, o que só aconteceria no ano de 2008; Isto é, passados 11 anos do traçado provisório e 16 anos do traçado até agora definito!
Alguém viu o novo troço, que terá estado camuflado como o santuário da caixa das receitas nos sentidos crescente e decrescente, onde se acende um “80” como em barraca de tiro ao alvo na Feira Popular? Por ali perto existe aquilo que, nos meus tempos de liceu de Viseu, já se chamava “O Caçador”. Não podia supor que a onomástica não podia ser mais apropriada à zona, anos volvidos.
A anormalidade de curva, naquela bruta natureza de 240 graus de raio (que a parta),foi contestada na altura pelos deputados sociais-democratas, considerando-a de "elevado risco" por um estudo técnico da secção autónoma de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro, revelado em Junho de 2005. Também a Associação de Cidadãos Automobilizados e um grupo de habitantes de Barbeita entregaram uma providência cautelar no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, para tentar impedir a conclusão da construção da "bossa do camelo". A concessionária, que não queria mais chatices e trabalhos a mais, garantiu que esta cumpria todos os requisitos técnicos, opinião corroborada por um juiz do tribunal que decidiu que, do ponto de vista técnico, este traçado não ofende qualquer norma legal. Ainda bem que este senhor juiz não seguiu engenharia; talvez nem devesse ter seguido magistratura.
Logo na inauguração do troço, mais propriamente no primeiro dia, “caíram” ali 600 condutores acima dos 80 Km/h0.
Os moradores da zona, muito propriamente, chamam com certa prosápia à “pista” a curva da bossa do camelo e interrogam-se como foi possível fazer-se, depois de Abril de 1974, uma curva tão pronunciada, que é mais um ponto negro nas estradas. Eu diria que é mais um buraco negro, sorvedouro de coimas e alcavalas que “branqueiam” as asneiras de quem não tem capacidade para sequer, no tempo das antas, orcas e mamoas, fazer um carreiro de cabras.
Agora questiono eu: com tantas interrupções e limites (entre Aveiro e Guarda há pelo menos 7), ainda têm a lata de portajar a A25? Não lhes chega a tesouraria da Curva da Bossa do Camelo?

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

A CURVA DA BOSSA DO CAMELO



Quando vinha do Porto pela A25, onde pago portagens e brancagens para gastar os pneus da viatura a uma velocidade máxima de 120 k/h, um "sniper" electrónico tirou a fotografia ao carro, que ia a 110 num limite de 80 (menos 1/3), na que chamam a Curva da Bossa do Camelo, cerca da Póvoa de Sobrinhos - Viseu. Presumo que seja electrónico, porque o auto traz o nome do autuante, posto e demais identificação, que pretende provar não ser um robot.
Ficam os condutores avisados: a quem se distrair, lá está a tesouraria, que faz uma boa colheita por dia, numa curva que tem um erro reconhecido e crasso de construção, mas que os governos deixam estar há mais de 10 anos (já o então ministro Mário Lino falou na bossa)...porque dá lucro, milhões por ano. Creio mesmo que, à conta desta bossa, se arranje dinheiro para construir nova auto-estrada ou mais um estádio de futebol.
Voltarei a este assunto (porque a bossa lá está e o camelo sou eu), logo que recolhidos mais dados - designadamente os pareceres e despachos que racaíram sobre aquele limite - uma vez que presumo ainda sejam do tempo em que a via fazia parte do neolítico traçado do IP5.
Reparem bem na foto. Vejo um armário junto ao poste do candeeiro, mesmo junto à ponte. Deve ser a tocaia do "sniper". Agora até fotografia mandam, não vá algum negar que jamais por ali gastou pneus.
À multa equivalente a 1 euro por cada km do limite de velocidade máxima de circulação naquela via - 120 euros - acresce a punição acessória de, pelo menos, 30 dias (sendo primário) com a carta suspensa de uma decisão que tardará a chegar daqui a 2 anos (há exemplos de um despacho com essa "mecha")! Ah!... E não esquecer que voam dois pontinhos da carta, numa incineração que visa um vindouro novo exame e mais receita, se outras acessórias não surgirem futuramente no bestunto de algum iluminado.
Se querem a segurança dos condutores, componham a bossa e deixem o camelo em paz!
Voltarei a este assunto.

A BANDA DE MÚSICA


Com chuva ou sem ela, a Festa de S. Sebastião prometia sempre. Sãos e doentes, que eu me lembre, lambiam-se de desejos pelo folguedo. Chegavam farroncas e brigões de lódão na mão e chapéu à banda; vinham romeiros duvidosos que queriam desougar o bandulho nas barracas dos comes e bebes; juntavam-se velhas beatas a segredarem orações e a cortarem na casaca do próximo; saltitava a canalha excitada, à lapada uns aos outros, com os desabitados pés apertados nas botas acabadas de estrear. Era natural que também aproveitavam a maré da chusma os pilha-carteiras e mais naturalmente deambulavam, a leste desses, dois ou três praças da Guarda Republicana, de peitos inchados e de “mauser” com bandoleira ao ombro, derrancadinhos por saírem dali com o lombo inteiro e o dever cumprido. Não faltavam os tunantes de costa direita a quererem esbanjar uns cobres e outros que, por desfastio ou engano, vinham desaguar ao arraial com tanta devoção como um asno bronco.
Mal entrava no redondel a banda de música, a coisa era séria e dava gosto ouvir. Se era rogada uma outra qualquer, das do lado da serra, a charanga dava mostras de perceber tanto de pautas como de lagares de azeite. Lembro-me de uma - não lhes sei dizer de onde, nem vem a propósito - em que o maestro coxeava à cabeceira como uma traineira batida pelas ondas, pendendo a cabeça de um lado para o outro, a compasso. Embora eu fosse um catraio, dava conta que o fulano não se preocupava muito com os desacertos, enquanto os músicos, com tal indulgência, abusavam forte e feio, mandando ao diabo a harmonia. Quando o repertório picava nos agudos, fazia julgar um carro de bois por uma ladeira abaixo. Enfim, tirante os ouvidos do bom padre – mais tarde, meu paciente mestre em Latim - para os patolas, fífias a mais ou a menos, interessava-lhes tanto como a praga do imposto braçal! Não lhes cobravam osso, ao contrário da “finta”. Puxassem o trombone e a tuba, rebentassem os foles no sopro; tinissem os ferrinhos; trupassem sem dó na pele do bombo a lembrarem-se da sogra, esfandegassem a seu belo prazer e a eito a partitura, festa é festa, minha gente!
Quando os músicos paravam para o descanso, corriam todos para a tasca de meu pai, onde naturalmente iam molhar a solfa. Lembro-me que em certa ocasião, um dos pilantras, que já vinha bem aviado - tocava aquela coisa preta à guisa de grande enguia tesa, que eu, na minha inocência, chamava pífaro - assentou-me, sem razão alguma, a palma da mão no cachaço, enquanto dizia para meu pai:
- Venha depressinha com a pinga! - E porque era apressado: - Mas isso vem hoje ou amanhã?
Dei conta que o marmanjo atirou com o boné para cima de um banco, enquanto ia aconchegando os dois quartilhos, alimentando a hidra ou a esponja que trazia no estômago.
Pensei, porque nem sequer era santo de pau, como o não sou hoje:
- Aquela pancada no toutiço doeu, mas não vais perder pela demora!
Apanhei-o distraído, agarrado ao copo como Prometeu ao rochedo, corri como uma seta para o banco, agarrei no boné e tratei de o levar por baixo da camisa, sem que ele se apercebesse da manobra.
Chamado à pressa, que só ele faltava no agrupamento (naquele estado, empregar o verbo "faltar" é uma força de expressão), foi pelo boné, mas este... quem o viu? Coçou a moleirinha, meio inclinado para trás e a beiça estendida para diante, enquanto os olhos divagavam à volta. Onde raio tinha deixado o barrete? Ia jurar que o tinha encomendado ao banco de madeira e não estava lá. Diabo, ele não tinha pernas!
Já soltava palavrão atrás de palavrão, quando uma mulherzinha entrou na taberna e o avisou:
- Ó ti coiso! Por acaso é seu aquele barrete que está ali fora, atrás do macho?
- Atrás do macho?! Catancho! Como foi lá parar?
Lá saiu aquele neolítico para fora, desperta a sua atenção para o sítio onde o Ivo "Langão", moleiro e meu primo, tinha prendido a cavalgadura da recovagem da farinha. O boné encontrava-se no chão, entre os quartos traseiros da besta, em posição invertida, como uma taça. Por dentro da copa e por fora, o cavalo tinha aliviado os intestinos, na forma de uns pomos redondos e acastanhados, com todo o aspecto fumegante de recente fornada.
- Foi o puto! Se apanho o gajo!...
Por essa altura, já eu me tinha posto a fresco, a rir-me da cena à janela do meu avô. E foi daquele zigurate que assisti à derradeira limpeza dos torrões de esterco do adereço filarmónico, enquanto o desconsolado músico, disputando com a gravidade palmo a palmo como uma barca no Nilo, dando conta do fedor que ia espalhar na banda, me prometia das boas:
- Até capo o miúdo, se o apanho!

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

QUAL A DIFERENÇA ENTRE BOSTA E BESTA?


Tudo levará a crer que a diferença entre os dois termos, a que se altera uma vogal, não é tão dissemelhante como se mostra à primeira vista. Bosta é o excremento da besta; enfim, um excremento qualquer, mas mais se aplica à besta que o deposita onde lhe dá a vontade e o aperto de intestinos. Também “orca” é um mamífero marinho, assim como “porca” um mamífero terrestre.
O termo bosta – devemos assentar isto bem – que nada teria de mal se não sofresse o estigma causado pela linguagem retorcida, de achincalhe, empregue na designação acintosa de pessoas ou instituições, leva a outras partículas. Assim se passa com besta. Continuam os dois vocábulos no mesmo patamar.
Um dia, em miúdo, assisti a este diálogo “amigável” entre vizinhas:
“- Tu não passas de uma bosta!”
“- E tu não passas de uma besta, que tens a boca cheia dela!”
Vem isto a propósito do uso – e demais divulgação – do termo, numa questão supostamente de combate ao racismo.
Quero deixar claro que não sou nem nunca fui racista, sejam as pessoas, singular ou individualmente, de que terras forem, a sua cor, etnia, religião ou condição. No entanto, sou a favor do decoro, principalmente quando a falta deste é levada em coro até ao público como forma de humilhar pessoa ou instituição.
Espanta-me que o caso tenha surgido de alguém ligado a um partido político, demais com funções na Assembleia da República, a Casa da Democracia, a qual merece dar-se ao respeito dos que lá trabalham e merecer o respeito de todos os cidadãos presentes neste País, portugueses ou estrangeiros. E mais me espanta que o partido a que a pessoa tem o vínculo, não tenha vindo, juntamente com o autor da “bosteira”, com um pedido de desculpa à instituição ultrajada e aos portugueses, mantendo o capricho do “silêncio” ensurdecedor de um chocalho.
Não se trata apenas do uso de uma palavra, noutro contexto inofensiva, se bem que na prática malcheirosa. Embora avaliando por alto, está em causa o insulto gratuito, de apelo à raiva ou ao ódio.
Se há razões na queixa, apurem-se; mas não se venha, invocando o racismo, abanando com os fantasmas de remotos avoengos racistas e esclavagistas, com palavras que têm a ferocidade e o mal de todos aqueles que possam ser racistas e só não são esclavagistas porque não os deixam.
Apetece-me invocar Sá de Miranda, assim:

Isto passado, quando me desponho,
e me quero afirmar se foi assi,
pasmado e duvidoso do que vi,
m'espanto às vezes, outras m'avergonho.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

ENCICLOPÉDIA ALEGRE DE BRUXAS (4)



ALTERNATIVA. Tal como acontece na tauromaquia, em que o toureiro, bandarilheiro ou cavaleiro, são investidos nas respectivas categorias, as bruxas também recebem a sua investidura; não em estoques, bandarilhas ou farpas, mas porventura em varinhas, alhos-porros ou vassouras voadoras, à moda antiga. E tudo com IVA a 6%, que isto é cultura.
Cabe ao diabo, arrogante e paternalista como é, a espadeirada que outorga o diploma à neófita em final de curso. Nessa gala, que fará lembrar a investidura de irmãos em capítulo de confraria, o fulgor da cerimónia acaba em agonia moral, abrindo-se entre o bode e as fêmeas as núpcias de uma bacanal, das fortes. Desta feita, o IVA sobe para 23%.

ANIMAIS. Um certo homem encontrou uma mulher montada num burro ao contrário e com muitas galinhas à volta, que logo se transformaram em duas lindas mulheres; mal ele se benzeu com a admiração, tudo desapareceu.
Por vezes, as bruxas aparecem nas encruzilhadas com a forma de uma porca que se faz acompanhar de leitões de cor escura ou, em alternativa mais moderna, colocam "twits" do género de Donald Trump, presidente dos americanos. O efeito para um mortal num encontro imediato de grau xis como aquele, não consta sequer do manual de instruções.

ANTÍDOTOS. Parece mentira, mas um rosário de alhos afigura-se ser eficaz como antídoto contra os malefícios da bruxaria. Também se julga com idêntico êxito um ramo de alecrim e arruda, uma tesoura aberta, um chinelo velho, uma meia calçada do avesso ou uma chamada telefónica inesperada do Presidente da República. Quem quiser complicar a receita, poderá juntar num saquinho algumas pitadas de rudo macho, espargo, mirra e mostarda. Simplificará se o conteúdo passar apenas com umas pedras de sal.
Com toda a humildade, não asseguro a eficácia. Uma ferradura atrás da porta, na grelha do automóvel ou na barra cama, parece ser o antídoto indicado para afugentar o bruxedo e quem o pratica, mas poderá fazer-se uma figa com os dedos indicador e médio à falta de um adereço mais apreciável, que é o signo-saimão (signo-salomão). Deixo um aviso, caso queiram servir-se dos dedos da mão: nada de esticar o médio e encolher ao mesmo tempo o indicador e o anelar.
Não encontrei qualquer referência alusiva à eficácia se a sogra estiver por perto. A sogra ou um fiscal das finanças, bem entendido.

ARRUDA. Mais conhecida é a Arruda dos Vinhos, vila portuguesa do distrito de Lisboa. Porém, como este trabalho não é de âmbito corográfico, a arruda que aqui se traz é considerada das ervas mais poderosas para combater inveja e olho-gordo. A superstição receita: um galho de arruda junto ao corpo ou na cozinha, calha para reter as energias negativas. As folhas secas servem para preparar um chá bem forte e com ele lavar o chão da cozinha, pelo menos uma vez por semana, para proteger a cozinha, a casa e deixar o chão lavado, do género lava-tudo, que sai na publicidade como lava e encera, ainda com o benefício das fragrâncias não alergénicas, sem fosfonatos e formaldeídos.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

OUTRO DOS MEUS PRÉMIOS LITERÁRIOS


A propósito das comemorações dos 75 anos de Manuel António Pina (1943-2012), escritor, jornalista e poeta do Sabugal, começam hoje, em Lisboa, até 9 de Fevereiro, as jornadas «Desimaginar o Mundo», dedicadas ao poeta, conforme li num dos blogs que tenho como referência:
Aproveitei então para ali colocar um comentário, logicamente com endereço à autora do blog, Dra. Maria do Rosário Pedreira, ela também poetisa e editora, onde disse:
"Manuel António Pina (1943-2012) é um homem da Beira e um poeta (dos poucos) que me apetece reler. Há outros, alguns até pouco lembrados, como é o contemporâneo Professor, Poeta e Ensaísta Joaquim Manuel Magalhães, que vale a pena reler; há outros, muitos, que nem vale a pena ler, porque é raro o português que diga não ter feito versos, o que levou um amigo a dizer-me, um dia: "quantos mais poetas, mais patetas".
Gostaria de ver homenagens, em vida, a Joaquim Manuel Magalhães. Para além de tudo, foi num programa dele, do Professor Magalhães, que ganhei um prémio literário (de prosa, mais propriamente no género conto), programa dito "Os Homens, os Livros e as Coisas", na RTP. A última obra que conheço dele é de 2010, "Um Toldo Vermelho", da Relógio d'Água, e presumo que tenha publicado recentemente uma reunião da sua poesia.
Manuel António Pina (n. 1943) e Joaquim Manuel Magalhães (n. 1945) são da mesma geração, embora a linha poética de ambos não seja tematicamente coincidente”.
Nesse programa da então RTP1, que foi para o ar, em directo, em 1975, o Professor catedrático Joaquim Magalhães premiou esse conto, que tem por título “O Ferro Velho” , dando-me a oportunidade de uma entrevista nesse programa, com a leitura do trabalho premiado.
Para quem não saiba, não fui premiado com dinheiro – o que é justíssimo e benigno, dado trata-se de um prémio literário – mas com um cheque-livros, numa importância assaz significativa, tendo apenas recebido, esse sim em dinheiro, o custo das deslocações e estada.
Esse cheque foi então rebatido em livros na Livraria Bertrand do Chiado. Ia preparado com um saquinho, quando afinal devia ter levado um saco. Escolhi o que queria, como queria e vim aviado com literatura que ainda hoje repousa, depois de naturalmente lida, na minha estante.
Anos depois, reuni esse conto – assim como um outro premiado em outro concurso literário – num livro, a que dei o título de “Crónicas do Arco da Velha”.
Ler esses trabalhos dos vinte e poucos anos é recuar no tempo, dado que hoje, bem mais maduro, encaro a escrita com novo tónus, picardia e pólvora bombardeira, entremeando com outras prosas mais sensatas, menos temperamentais e sobretudo serenas.

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

NEM PESSOA ESCAPA; OS PÂNDEGOS E AS PUTAS TAMBÉM NÃO


Fernando Pessoa – aliás Álvaro de Campos – devia adivinhar que não estava a escrever apenas para a sua época, podendo então poetar o que lhe apetecesse; devia ter compreendido que chegaria o tempo em que a censura e a moralidade, os costumes e o diabo a quatro, iriam riscar (ou omitir, o que lhe dá as mesmas voltas), o que pode ferir os meninos e meninas na escola, principalmente com o crivo de uma editora (nem sequer digo o nome) que lhe levou a poesia aos manuais escolares.
Aqui é que bate o ponto.
Trata-se do poema "Ode Triunfal", que a editora levou ao manual "Encontros", alegando conter três versos com linguagem grosseira... para o 12º ano!
Se a senhora editora não gostava, não publicava no manual; a publicar, fazia-o na íntegra. Há a considerar que Álvaro de Campos (aliás Fernando Pessoa), ao escrever “ó automóveis apinhados de pândegos e de putas”, referia-se aos veículos da época e às ditas contemporâneas.
Até o corrector automático me sublinha a vermelho aqueles dois vocábulos "pândegos" e "putas" como se ninguém os pronunciasse hoje em dia. Uma palermice!
Parece-me que hoje, ao contrário do tempo do grande Poeta (à cautela, o desenho em cima é meu) – eu admiro-o como o maior no seu génio e no género – não se confirma o que Pessoa/Álvaro disse da época, até porque: primeiro, a pândega nos automóveis acabou, a não ser que se queira arriscar soprar ao balão; segundo e último, as putas estão à beira da estrada, coitadas, na esperança de entrarem neles quando não se encontram apinhados.
O patusco é que ninguém se insurge com esta psicose, principalmente os que se fartam de falar no lápis azul do antigo regime. Apeteceu-me dizer um palavrão, daqueles com cabeleira que também são riscados no manual da editora, e já o disse, pelo que não o vou escrever.
No “placard”, o resultado ao intervalo (que deve ser o do final) é: Pessoa/Álvaro de Campos-1 – Editora do Porto-0.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

UM DOS MEUS PRÉMIOS LITERÁRIOS

Tinha eu 30 anos quando fui premiado num concurso literário.
Na arrumação periódica do meu acervo literário e artístico, deparei hoje com um livro, datado de 1981, onde foi publicado o meu trabalho premiado, um dos dois que conseguiram essa escolha (o outro trabalho premiado foi da Professora Doutora Maria Máxima Vaz Neves Pires).
Tinha eu acabado de completar 30 anos de idade quando concorri ao Prémio Literário Nuno de Montemor, aberto pela Câmara Municipal da Guarda.
Mal conhecia a Guarda, pouco tinha lido da obra do autor quadrazenho (de Quadrazais-Sabugal), pelo que recorri a uma verdadeira maratona de leituras (o autor publicou cerca de três dezenas de títulos, entre poesia, conto e romance), fiz algumas pesquisas na altura em que não havia internet's, google's e quejandos, e entrevistei um sobrinho do autor.
Trabalhei tudo na minha pequena máquina de escrever e concorri. Felizmente consegui ser premiado e vi reproduzido o trabalho na obra, com imagem a abrir este texto. Já lá vão 36 anos.
Da entrada do livro, à guisa de prefácio, da autoria do Pelouro da Cultura da Câmara da Guarda, reproduzo o texto a seguir:
JUSTIFICANDO UMA INICIATIVA
Quis a Câmara da Guarda, através do Pelouro da Cultura, comemorar o 1.° Centenário do nascimento do escritor padre Joaquim Augusto Álvares de Almeida, conhecido, no mundo das letras, por Nuno de Montemor.
No âmbito das comemorações, promoveu conferências e um certame literário, subordinado ao tema:
«Nuno de Montemor, Escritor Guardense Sua Vida e Obras».
Para dar mais relevo aos trabalhos apresentados, e tornar mais conhecida a obra do homenageado, foi deliberado, em sessão camarária, mandar editar um pequeno Livro, composto pelos trabalhos que obtiveram os dois primeiros prémios. São eles: «NUNO DE MONTEMOR — UM ESCRITOR GUARDENSE, SUA VIDA E OBRA, da autoria de Maria Máxima Vaz Neves Pires e «NUNO DE MONTEMOR — SUA VIDA E OBRA» da autoria de Fernando Jorge dos Santos Costa.
Julgamos, deste modo, ter contribuído para o melhor conhecimento dum dos maiores vultos das Letras, que viveram na nossa Terra. Descreveu, com realismo inexcedível, costumes e tarefas das nossas aldeias, divulgando o folclore regional; entoou cânticos de louvor a tudo o que há de belo e singular na nossa Estrela, em páginas dignas de figurarem em qualquer antologia da Língua Portuguesa.
Queremos, nesta homenagem simples, recordar um dos maiores encantos da Vida de Nuno de Montemor — Lactário Dr. Proença — onde, o poeta do «Amor de Deus e da Terra», passava a maior parte dos seus dias, procurando minimizar o sofrimento dos mais carecidos de bens materiais, e onde, possivelmente, se inspirou para escrever alguns dos seus mais belos poemas.
Outubro de 1981

A Câmara Municipal