Continuação da entrevista encetada no post anterior, ora concluída neste.
A imagem respeita a uma vinheta de "Rainha Africana", projecto não concluído e adaptado do romance de C. S. Forester e do filme "African Queen", de John Huston, com Humphrey Bogart e Katherine Hepburn. Junto o projecto da mesma vinheta, mas a traço negro.
Em
publicações periódicas, tens maior prestação em “ O Crime” e “Mundo de Aventuras”.
Donde guardas melhor satisfação ?
Melhor satisfação foi, sem dúvida, a do “Mundo de
Aventuras”, até porque este era então gerido por uma figura incontornável e
irrepetível da BD nacional naquele sector, que é o Jorge Magalhães. Ele teve a
ideia de abrir as páginas de uma revista conceituada aos mais novos, aos
diletantes, aos principiantes, um risco que poucos estariam dispostos a correr.
O certo é que correu bem e saíram da iniciativa bons desenhistas e
argumentistas. Foi um alfobre.
Quanto a “O Crime” foi um desafio; e os desafios
causam-me gosto. A somar a isto, foi compensador em termos metálicos do
porta-moedas.
Há um
estranho aspecto na tua carreira : às vezes, prometedoras apostas, ficam
“abandonadas” ! São os casos, por exemplo, de “A Volta ao Mundo em Oitenta
Dias” e “A Rainha Africana”. Não vais mesmo terminar estes trabalhos ?
Tenho em mim um espírito troglodítico, ancestral.
Se o terreno não é propício à minha caçada, não é por isso que me dedico à
agricultura: vou caçar para outro lado. À margem da metáfora, afirmo que isto
nem é por achar que determinado trabalho não tem saída, mas por fastio. O
abandono é, assim, temporário. Quando a “saudade” ou a “fome do assunto”
apertar, volto lá, mesmo que tenha de refazer tudo, de cabo a rabo.
“A Volta ao Mundo” ficou na viagem por um quarto do
seu todo e aguarda o “click” para vir para cima da bancada; “A Rainha Africana”
é uma obra que necessita de prateleiras por todo o país e não estou tentado a
correr o risco de a receber de volta com os percalços ditos atrás ou a bater às
aldrabas das portas com um chapéu emprestado.
Julguei que os blogs – pelo menos o meu –
constituíssem uma espécie de barómetro para aquilatar das apetências sobre este
ou aquele trabalho. Às vezes, pelo “silêncio”, dá-me a sensação que mais me
valera pôr um surdo a ouvir uma partitura de Bach.
Nas
nossas novas gerações têm surgido, embora com mais joio do que trigo, alguns
valores muito bons. O que pensas sobre isto ?
Tanto há trigo num campo de joio, como há joio num
campo de trigo, o que parece ir dar ao mesmo. Considero que as novas gerações,
numa maioria relativa, são mais trigo do que joio. O que falta são bons
tratadores, segadores e consumidores, uma grande maioria mais inclinada para
misturas transgénicas de má qualidade.
Há valores muito bons, muito bons mesmo. Cito o
exemplo daquele jovem de Penalva do Castelo (na periferia como eu), o Rafael
Sales. Assim ele não esmoreça com os entraves de que falei antes. Iremos ouvir
falar muito dele e, mais ainda, ver obra sua publicada.
De um largo naipe, retiro mais um nome: o de Carlos
Pais, um jovem professor de EVT/Educação Visual (actualmente no agrupamento do
Sátão), que fez o favor de me mostrar um trabalho seu não editado, e que o
merece ser. Uma obra magnífica em termos de traço próprio, que salta aos olhos.
Cito só estes dois exemplos, para não me alongar…
Que
sentiste ao receberes o “Troféu Anim’arte-2016”, pelo GICAV, na categoria Banda
Desenhada ?
Senti o deslumbramento de receber um troféu,
principalmente por ser atribuído por um Grupo que tem lutado pela dignificação
e divulgação das Artes, de todas elas. Foi uma honra para mim. E senti que, na
imensidade de nomes que poderiam ter estado nessa cerimónia, estarão outros que
mereciam essa distinção
Qual o
teu grande e próximo projecto ?
Suponho que foi Napoleão - se não foi ele, sou eu
que agora o afirmo - que disse mais ou menos isto: “o meio mais seguro de
manter uma promessa é não a prometer nunca”.
Tenho, nesta altura, a ideia de dar à estampa a BD
sobre a “Vida e as Profecias do Bandarra”, que tenho em execução numa mistura,
a cores, entre desenho e fotografia.
“Bandarra” vende muito bem, pelo que tenho de
pensar como editor. No entanto, como já acabei a primeira parte do Magriço (260
páginas a preto), não sei se anteciparei esta à anterior.
Como diz o povo, é melhor ver de perto para contar
de certo.
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